Teologia Feminista: uma visão cega sobre a mulher

Este poderia ser mais um texto sobre feminismo e suas ondas ou a argumentação de que ele é plural demais para ser discutido ou analisado, de que “graças a ele, demos voz às mulheres”, ou ainda sobre a incompatibilidade entre o evangelho e o feminismo. Mas acima de tudo, quero que este texto seja um lembrete, como daqueles que colocamos para não nos esquecer de tomar um remédio diariamente. Um lembrete para olhar para a Palavra de Deus, colocando diante de todas nós um espelho, não para apontar para o “movimento feminista” e suas tantas faces, mas para ver o quanto há desses comportamentos, pensamentos atitudes e palavras em cada uma de nós.

Empoderadas

Muitas de nós não se diriam feministas apenas por procurar a felicidade e desejar ser capaz de tomar decisões sobre si.  Aliás, creio que para a maioria de nós, cristãs professas, que talvez tenha algum conhecimento da Palavra, e que, como eu, tenha crescido na igreja e até investido um bom tempo em estudos sobre o movimento feminista, soa ofensivo ser identificada como feminista. Mas provavelmente há inúmeros aspectos da sua identidade como mulher que foram impactados pelo feminismo, não importa como você se identifique hoje. Precisamos, então, ser confrontadas com o ensino da Escritura.

Em uma busca simples por significado, “empoderamento” é definido pelo dicionário Aurélio como: ação de se tornar poderoso, de passar a possuir poder, autoridade, domínio sobre; passar a ter domínio sobre a sua própria vida; ser capaz de tomar decisões sobre o que lhe diz respeito; ação ou efeito de empoderar, de obter poder.

Exemplo: empoderamento das mulheres. “Empoderamento” encontra ênfase na sua própria felicidade, tornar-se a sua própria fonte de significado. Parece atraente como o que você ouve por aí, não é mesmo? Em uma busca rápida, você pode ler frases motivacionais como: “Mulheres que investem em si vão mais longe!”, “Seja você, para você! Sempre!”, “Você precisa amar a si mesma para poder amar outra pessoa”, “Escolha investir na sua própria felicidade.” Acrescente as frases motivacionais que desejar, e a lista é infindável.

O cenário em Gênesis 3 revela a triste história daqueles que buscaram sua própria felicidade, questionando a Deus e cedendo a si mesmos:

 “A serpente era o mais astuto de todos os animais selvagens que o Senhor Deus havia criado. Certa vez, ela perguntou à mulher: ‘Deus realmente disse que vocês não devem comer do fruto de nenhuma das árvores do jardim?’.

‘Podemos comer do fruto das árvores do jardim’, respondeu a mulher. ‘É só do fruto da árvore que está no meio do jardim que não podemos comer. Deus disse: ‘Não comam e nem sequer toquem no fruto daquela árvore; se o fizerem, morrerão’.’

‘É claro que vocês não morrerão!’, a serpente respondeu à mulher. ‘Deus sabe que, no momento em que comerem do fruto, seus olhos se abrirão e, como Deus, conhecerão o bem e o mal.’

A mulher viu que a árvore era linda e que seu fruto parecia delicioso, e desejou a sabedoria que ele lhe daria. Assim, tomou do fruto e o comeu. Depois, deu ao marido, que estava com ela, e ele também comeu.” (Gênesis 3.1-6; grifo da autora)

Precisamos perceber a gravidade da nossa condição e entender que todas nós temos um problema, como Carolyn Mcculley escreveu:

“O feminismo (assim como a maioria dos ‘ismos’) aponta o dedo para os outros pelos problemas da vida. Mas eu aprendi que a Escritura nos diz que as outras pessoas não são o verdadeiro problema. Nossa natureza pecaminosa (Tg 4.1-3), as forças do mal (Ef 6.12) e a sedução do mundo presente (1Jo 2.15-17) são nossos verdadeiros problemas.”

O feminismo começa antes de qualquer “onda” em que se costuma dividir o movimento. Começa no jardim do Éden. Eva se deixou levar pela serpente, que prometeu que ela poderia “ter domínio sobre a sua própria vida” e seria “capaz de tomar decisões sobre o que lhe diz respeito”. Ela poderia conhecer tudo, mas Deus parecia limitar seu potencial.

Cada uma de nós provavelmente não é declaradamente feminista, mas carrega a essência de toda e qualquer ideia que o mundo nos ensina, que coloca nosso EU no centro, excluindo Deus. Carregamos o pecado, a rebelião contra Deus, uma visão egocêntrica e idólatra de si mesma.

“Ame-se!”

Ah, mas nós não somos assim rebeldes, não deixamos Deus de lado porque queremos ser “donas de nossa própria história”, por podermos encontrar felicidade quando encontramos satisfação em nossa vida pessoal, relacionamentos e carreira, e por nos valorizar, afinal, ninguém fará isso por nós, não é mesmo? Parece tão legítimo querer valor, reconhecimento, amor e realização. E isso é totalmente diferente de dizer: “Sou meu próprio dEUs.”

Adão e Eva questionaram a fonte de toda verdade, bondade e beleza, buscaram seus próprios desejos, questionaram a autoridade, olharam para si mesmos como sua própria fonte de significado, satisfação e realização, acreditando que suas escolhas, à parte de Deus, poderiam lhes trazer o que Deus estava deixando de dar.

O pecado surge do desejo insatisfeito, e não necessariamente de negar Deus abertamente. Eva ansiava, por si mesma, conhecer o bem e o mal, sendo que só Deus é a fonte do conhecimento do que seria o melhor para ela e Adão. E assim somos todas nós. Somos aquelas que acreditam que o que Deus está fazendo não é necessariamente bom, já que poderia ser do “meu jeito”, porque “não era isso que eu esperava”. O que acontece é que fazemos isso na prática, e diante disso, satisfação, realização, felicidade, senso de significado e valorização são temporários.

Quando presumimos que somos nossa própria fonte de satisfação, passamos a viver fora dos limites que Deus nos dá. Sempre que obedecemos a outras vozes, como aquelas que dizem “Ame-se a si mesma” e “Siga seu coração”, ignoramos a voz de Deus. Cada vez que lutamos limitadas nas nossas próprias forças e para a nossa própria glória, negamos a verdade de quem Deus é e de quem nós somos. Em vez de refletirmos o poder, a glória e a bondade de Deus, nós atraímos o poder e a glória para nós mesmas. Amamo-nos excessivamente, e estamos fadadas a viver insatisfeitas e cada vez mais centradas em nós mesmas.

O alerta de Pauloao enumerar lista de pecados em ordem crescente é o exato oposto de “ame-se”, já que o amor a si mesmo, desde o Éden, é um grande problema:

“Sabe, porém, isto: que nos últimos dias sobrevirão tempos trabalhosos; porque haverá homens amantes de si mesmos, avarentos, presunçosos, soberbos, blasfemos, desobedientes a pais e mães, ingratos, profanos, sem afeto natural, irreconciliáveis, caluniadores, incontinentes, cruéis, sem amor para os bons, traidores, obstinados, orgulhosos, mais amigos dos deleites do que amigos de Deus, tendo aparência de piedade, mas negando a eficácia dela. Destes afasta-te.” (2 Timóteo 3.1-5; grifo da autora)

Diante disso, somos todas feministas quando nossa mente e coração, embora neguem ativamente ideologias tão explicitamente contrárias a nós, nos levam a agir de maneira que nosso comportamento demonstra que olhamos para tudo a partir de nós mesmas, e não de Deus. Timothy Keller, escrevendo sobre o ego, mostra que a felicidade está na pessoa pensar cada vez menos em si mesma como protagonista:

“Posso começar a me alegrar com as coisas que não giram em torno de mim. Meu trabalho não gira em torno de mim, o esporte que pratico não gira em torno de mim, minha vida amorosa não gira em torno de mim, meu namoro não gira em torno de mim. Apreciarei as coisas pelo que são, e nada mais […] Quem não deseja algo assim? Mas isso está fora das nossas categorias. Esse é o bendito autoesquecimento; é a humildade do evangelho. É não pensar em mim mesmo como se fosse mais do que sou, como nas culturas modernas, nem pensar em mim como se fosse menos do que sou, como nas culturas tradicionais. É simplesmente pensar menos em mim mesmo.”

“Esse é o meu jeito!”

 É importante entender que atitudes vitimistas também são egocêntricas, excessivamente focadas em si mesmas, manifestando uma manipulação pecaminosa. A manipulação é fruto do comportamento daquele que a Bíblia qualifica como “insensato”, porque não aceita que suas vontades não sejam atendidas, e geralmente interpreta tudo como uma grande conspiração contra si. A Bíblia chama atitudes como essas de insensatez. O insensato não tem prazer no entendimento, e acaba revelando o íntimo do seu coração autocentrado (Pv 18.2, Mt 12.34).

Estamos diante de uma questão espiritual, porque uma vez que somos encontradas pelo Evangelho, encontramos nele o descanso e a possibilidade de transformação para todas as nossas atitudes que não estão de acordo com o que Cristo nos dá como modelo. O evangelho mostra que não somos vítimas imutáveis, e que a “síndrome de Gabriela (“Eu nasci assim, eu cresci assim, vou ser sempre assim”)”, ou “esse é o meu jeito”, encontra uma nova natureza em Cristo, que nos diz que é preciso ser renovadas por Ele, para que pensemos menos em nós mesmas, e ELE brilhe em nós (Ef 5.22):

“Portanto, abandonem a velha natureza de vocês, que fazia com que vocês vivessem uma vida de pecados e que estava sendo destruída pelos seus desejos enganosos. É preciso que o coração e a mente de vocês sejam completamente renovados. Vistam-se com a nova natureza, criada por Deus, que é parecida com a sua própria natureza e que se mostra na vida verdadeira, a qual é correta e dedicada a ele.”

Somos todas feministas

Quando escolhemos a nós mesmas, nossa vida, história, sucessos ou insucessos como a narrativa central, colocando todos os nossos interesses em primeiro lugar, somos incapazes de ver qualquer coisa fora de nós mesmas, seja para o nosso “bem” ou “contra nós”. Assumindo essa perspectiva, nunca seremos mulheres felizes. Com isso, não podemos dizer que Deus não queira que você experimente realização e felicidade. Ele quer! Ele quer que esse chamado traga a você maior prazer e alegria Nele, não em si mesma. Porque Deus nos criou para um propósito específico, precisamos da confiança nele, que ele mesmo nos dá, para crer e perceber que Ele sabe o que está fazendo.

Em um mundo que não reconhece o Criador, somos encorajadas a encontrar satisfação à parte do que Deus é e está fazendo, porque precisamos ser “protagonistas da nossa própria história”. Sem Deus, porém, encontramos uma ambição vazia. Cada uma de nós é, portanto, uma feminista quando pensa em primeiro lugar em si mesma, não em Cristo, como modelo e resposta. Mas não conseguiremos fazer isso por nós mesmas. Precisamos que o próprio Cristo, em quem devemos pensar, renove a nossa mente e coração autocentrados.

Termino com as palavras de Carolyn McCulley sobre o verdadeiro “empoderamento”, em que poder e glória são dados ao único digno de recebê-los:

“É necessário ser uma mulher ousada para viver contrariamente à sua cultura, escolhendo a glória de Cristo acima de qualquer honra pessoal.”

Por Jéssica Sayuri

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