[Se] Deus é bom…

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ATENÇÃO: texto longo. Por isso, KEEP CALM e seja paciente <3

Esse texto foi escrito a pedido de uma amiga querida que gostaria de saber como os cristãos devem responder ao problema do mal no mundo.

Esse é um dos temas mais espinhosos da Teologia[1]. Nem mesmo Agostinho, uma dos maiores teólogos da história concluiu a questão. Então, não tenho eu a pretensão de responder a tudo, mas vou tentar de forma simples, resumida e bíblica trazer um pouco de esclarecimento sobre o assunto. Espero que ao fim desse post algumas dúvidas tenham sido sanadas. Em todo caso, vocês podem deixar dúvidas nos comentários.

Por se tratar de um assunto COMPLEXO não tinha como deixar o texto menor que isso (na verdade, até que o reduzi bastante rs).

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Um dos grandes dilemas da humanidade é a questão do mal. Nascemos dentro de um mundo caído, corrompido pela maldade e não conhecemos o paraíso que era o mundo antes do pecado. Toda realidade que conhecemos é apenas um reflexo deturpado daquilo que deveria ser. Apesar disso, algo em nós – mesmo no mais cruel dos homens – diz que o mal não é o padrão moral para o qual fomos criados.

Embora a sociedade esteja corrompida, todo ser humano sabe em seu íntimo que há algo de errado com o mal, mesmo um ladrão se sente ofendido quando roubado. Diferentemente dos animais, nós temos consciência do que é bom e do que é mau. Toda vez que ocorre uma transgressão, seja de nossa parte ou da parte de outros, nossa consciência acusa o erro. Isso ocorre porque o mal é uma transgressão contra a lei que Deus colocou na mente de todo ser humano.

Ninguém em sã consciência reage com naturalidade e alegria diante mal. O mal não é natural, ele é como um alienígena que vem subtrair de nós a bondade e a beleza com a qual Deus nos presenteou na Criação. Por onde passa, o mal deixa seu rastro de destruição, dor e tristeza.

Diante disso, muitos usam a existência do mal como argumento para sustentar sua incredulidade. Se Deus é bom, dizem eles, por que existe o mal?

As respostas comumente apresentadas para esse dilema são basicamente estas:

  • Não existe Deus, logo não há um ser supremo regendo o universo. Cada um é livre para fazer o que quer e a busca pelo prazer está acima de tudo.
  • Deus existe, mas ele não é bom, antes é um tirano egocêntrico que tem prazer em produzir tragédias e sofrimento.
  • Deus existe, Ele é bom, mas não pode fazer nada para impedir o mal. Ele até gostaria, mas está amordaçado pelas circunstâncias e pelas decisões humanas. Deus não pode interferir (infelizmente, essa última afirmação tem sido, muitas vezes, utilizada por cristãos para tentar explicar a existência do mal no mundo).

Diante de tantas respostas e do sofrimento das pessoas, como nós cristãos devemos responder à pergunta:

“Se Deus é bom, por que Ele permite o mal?”

É bem provável que você já tenha se deparado com essa pergunta. Certamente, em algum momento da sua vida você perguntou a Deus “por que?”. Por que tanto sofrimento? Por que tanta maldade? Onde está Deus em meio a tudo isso? Por que Deus simplesmente não acaba com o mal? Talvez estas sejam algumas daquelas perguntas espinhosas que nós evitamos por medo de nos tornarmos céticos.

Perguntar não é mau, a dúvida é o que nos faz ir em busca de respostas. O ponto é que a dúvida em relação àquilo que desconhecemos nunca deve se sobrepor àquilo que de fato conhecemos.

O que isto quer dizer?

Bem, antes de levantar questionamentos, precisamos ter com clareza em nossa mente as verdades fundamentais acerca de Deus. Não podemos deixar que aquilo que não sabemos a respeito de Deus ponha em dúvida aquilo que de fato sabemos a Seu respeito. O que sabemos sobre Deus é o que Ele revelou em Sua Palavra. Logo, é por ela que devemos começar.

Primeiramente, enquanto cristãos crentes na Palavra de Deus, sabemos e professamos que Deus existe. Gênesis 1:1 afirma que “No princípio, criou Deus os céus e a terra”. Há um Deus criador dos céus e da terra. Ele é real e a própria criação é testemunha disso (Sl 19:1). O mundo não está abandonado à sua própria sorte, pois há um legislador que governa as nações.

“Pois o Senhor Altíssimo é tremendo, é o grande rei de toda a terra (…) Deus reina sobre as nações; Deus se assenta no seu santo trono” (Sl 47:2,8)

Deus existe está regendo o universo.

Em segundo lugar, sabemos que Deus não é um tirano, muito menos se alegra com o mal, pelo contrário, Ele afirma que odeia o mal (Is 61:8). Ele não tem prazer na injustiça.

“Tu não és um Deus que tenha prazer na injustiça; contigo o mal não pode habitar. Os arrogantes não são aceitos na tua presença; odeias todos os que praticam o mal. Destróis os mentirosos; os assassinos e os traiçoeiros o Senhor detesta” (Sl 5:4-6)

Sabemos que Deus é justo (Dt 32:4; Sl 5:4; Sl 7:9). Deus não tolera a injustiça. Ele tanto odeia a injustiça que foi capaz de sacrificar seu próprio Filho pra nos tornar justos para Ele. Se o mal fosse algo no qual Deus tem prazer, Ele nos aceitaria sem a necessidade do sacrifício de Cristo. A morte do Filho é a maior prova de que Deus é justo e odeia o mal. Ele julgou os pecados dos eleitos no Filho e há de julgar todos os pecados e todo o mal no juízo final.

“Deus é fidelidade, e não há nele injustiça; é justo e reto” (Dt 32:4)

Dito isso, vamos analisar a pergunta:

“Se Deus é bom, por que Ele permite o mal?”

O problema dessa pergunta é que ela parte do pressuposto errado. Ela parte do pressuposto de que Deus pode não ser bom; o que contraria o que a Bíblia diz. Nós cristãos cremos que Deus é bom porque a sua Palavra diz isso, logo, não podemos partir do pressuposto se porque sabemos que Deus é bom (Sl 145:17; Mc 10:18; Sl 136:1; Sl 106:1; Lm 3:25; Mt 5:44-45).

“Ninguém é bom senão um, que é Deus” (Mc 10:18)

“Justo é o Senhor em todos os seus caminhos, benigno em todas as suas obras” (Sl 145:17)

Essa verdade percorre toda a Bíblia, seja em tempos de guerra ou de paz, a Bíblia sempre nos afirma que Deus é bom. Portanto, a existência do mal não pode ser usada para invalidar a bondade de Deus. Deus é bom, a despeito do mal.

A Bíblia também afirma que Deus é imutável (Ml 3:6; Tg 1:17; Sl 33:11). Logo, Ele não pode deixar de ser bom. Não há, nunca houve e nunca haverá um único momento em que a bondade de Deus tenha sido afetada. Deus é bom o tempo todo. De eternidade em eternidade Ele é bom.

“Porque eu, o Senhor, não mudo” (Ml 3:6)

Sendo assim, a pergunta a ser respondida é: por que existe o mal?

A Bíblia nos explica isso lá em Gênesis 3, onde lemos a narrativa da Queda. Por causa da desobediência de Adão o pecado entrou no mundo e contaminou toda a raça humana (Rm 5:12). Deus afirmou que o coração do homem é mau desde a sua infância. A passagem de Gênesis 8:21 é a maior prova de que não é o meio que corrompe o homem, mas o homem é quem corrompe o meio, pois quando Deus afirmou isso os únicos habitantes da terra eram a família de Noé, os únicos sobreviventes do Dilúvio. De onde teria surgido o mal então, senão do coração deles?

O coração do homem se tornou mau por causa do pecado. Quem pratica a maldade é a própria humanidade e ainda que ocorram catástrofes na natureza, em última estância o culpado sempre será o homem, pois por causa do pecado de Adão a terra se tornou maldita (Gn 3:17). Quando Adão pecou, ele introduziu o pecado e com ele toda sorte de males na humanidade e na terra. Desde a Queda a terra tem sofrido os efeitos do pecado. Terremotos, vendavais, desastres naturais, são algumas consequências disso. Portanto, uma resposta bem simplista para esta questão é que o mal existe porque o homem desobedeceu a Deus.

Agostinho definiu o mal como a privação do bem. Para ele o mal é a corrupção da natureza boa criada por Deus.

“Pois o mal não tem natureza positiva; mas a perca do bem recebeu o nome de mal” (Agostinho)

A Bíblia afirma que Deus é o criador de todas as coisas boas e nós depositamos nossa fé nessa verdade:

“Viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom”. (Gn 1:31)

Segundo Agostinho o mal não foi criado por Deus, ele é o posto do bem de Deus, assim como as trevas são a privação da luz.

Como eu disse no começo, essa questão do mal não é nada simples. A abordagem de Agostinho sobre esse assunto é bem profunda e exige a queima de alguns neurônios, por isso, não pretendo me ater muito a essa questão[1].

O que precisamos saber é: Deus não é o autor do mal. Precisamos sempre nos lembrar que o mal aconteceu como um ato de rebelião contra Deus, primeiramente em Satanás e depois em Adão. A rebelião das criaturas contra o seu Criador é a causa do mal. O mal que nós presenciamos no mundo nos dá uma pequena dimensão do tamanho da rebelião humana contra Deus. Deus em sua misericórdia ainda tem refreado o mal para que a terra seja um lugar habitável, mas quanto mais o homem se rebela contra Deus, pior ele se torna, tornando também o mundo um lugar cada vez mais terrível.

Imagine a seguinte cena: um criminoso diante do Supremo Tribunal onde está sendo julgado; mas, ao invés de se colocar em sua condição de réu e a admitir a sua culpa, ele começa julgar o juiz e atribuir-lhe a culpa dos crimes que o próprio criminoso cometeu! Essa atitude seria no mínimo absurda, não é mesmo? Pois é isso que as pessoas fazem diariamente quando culpam a Deus pelo mal existente no mundo. Elas estão tão cegas que nem se dão conta de que quem está sob julgamento são elas própria e não Deus. Ele é o Juiz Supremo de toda a terra e os homens são todos culpados diante dEle.

“Pois desde a criação do mundo os atributos invisíveis de Deus, seu eterno poder e sua natureza divina, têm sido vistos claramente, sendo compreendidos por meio das coisas criadas, de forma que tais homens são indesculpáveis” (Rm 1:20)

A terceira resposta usada para explicar a existência do mal é que Deus não pode impedir o mal. Ele até gostaria, mas simplesmente não pode interferir. Ele está amordaçado. Esse argumento é tão antibíblico quanto os outros e é assustador que ele seja defendido por tantos cristãos. Esse argumento fere diretamente a Soberania de Deus e coloca o homem no lugar que pertence a Deus. Se Deus tem de se sujeitar à vontade humana, logo Ele não é o Todo-Poderoso, como a Bíblia afirma. E se Deus, não pode interferir no curso da história estamos perdidos porque quem garante que no fim das contas Seus planos serão cumpridos? Já que a história segue seu próprio rumo e Deus está sujeito a ela, que esperança nós temos? Isso é no mínimo desesperador. Significa que Deus não tem o total controle do mundo, logo, nós não temos garantia alguma. Estamos à mercê do acaso. Isso é desolador e não se assemelha em nada com o Evangelho da esperança (Rm 5:5).

Deus afirma:

“Eu sou Deus, e não há outro semelhante a mim. Que anuncio o fim desde o princípio, e desde a antiguidade as coisas que ainda não sucederam; que digo: O meu conselho será firme, e farei toda a minha vontade” (Is 46:9-10)

A Bíblia nos revela que Deus é Soberano, isso significa que Ele não está sujeito a nada nem a ninguém. Deus é o único Ser supremo e independente. Somente Ele tem o direito e o poder de fazer absolutamente o que Lhe agrada. Isso é muito curioso porque por mais independentes que os seres humanos afirmem ser, tal afirmação é totalmente absurda à luz da realidade na qual estamos inseridos.

Nos consideramos seres independentes, no entanto, não controlamos a nossa concepção, nossa vida, nem a nossa morte. Não tivemos controle sobre a fecundação do óvulo a partir do qual fomos criados. Durante nove meses fomos totalmente dependentes de outro ser, do qual continuamos dependendo mesmo depois do nascimento. Nos consideramos independentes, mas sequer conseguimos ficar de pé sem dependermos da gravidade. Morremos em instantes se nos for tirado o oxigênio. Pensamos ser donos do nosso destino, mas sequer sabemos se estaremos vivos daqui um minuto e por mais que desejemos, não podemos controlar isso. Não somos independentes, pois estamos totalmente sujeitos a um mundo cujas regras não criamos e do qual dependemos pra viver. Somos inquilinos e não donos.

Mas Deus Criou este mundo. O Soberano já existia antes que houvesse mundo, mas nós só existimos dentro do mundo. Portanto, ainda que desejemos, não somos independentes. A Ciência afirma que o ser humano não tem condições de viver em outro planeta. Somos totalmente dependentes desse sistema dentro do qual Deus nos criou. Apesar disso, ainda há quem afirme que Deus está sujeito ao homem.

O Criador tem total direito sobre a criatura (Rm 5:19-21).

Deus não está amordaçado pelo mal – nem tampouco pelas decisões humanas – caso contrário, estaríamos afirmando que o mal é uma força independente maior ou equivalente a Deus. Em outras épocas tal afirmação foi classificada como heresia. Não existe nem um poder no Universo equivalente a Deus. Seus propósitos não podem ser frustrados pelos homens, pela natureza ou qualquer outra força existente.

“O bem não é o ‘oposto’ do mal. O bem está acima do mal” (Pondé)

“Não pensem que o mal é uma potência rival de idêntico poder ao do nosso bom Deus” (Martinho Lutero)

A existência do mal não significa que Deus esteja impotente. Pelo contrário, não fosse Deus reter o mal, o mundo seria um lugar muito pior do que conhecemos. Embora exista o mal, ainda encontramos pessoas que buscam ser moralmente boas. Não fosse Deus, nós sequer saberíamos o que é bondade. Pela graça de Deus, apesar da rebelião humana, a lei de Deus ainda opera na consciência dos homens fazendo com que eles sigam alguns princípios morais. Isso é o que mantém a ordem nesse mundo rebelado.

Deus é Soberano sobre toda a criação. Tudo foi criado dEle, por meio dEle e para Ele e retém o controle absoluto de todas as coisas.

Tendo respondido às questões que são usadas para tentar explicar a existência do mal. Vamos à parte prática.

Temos vivido tempos difíceis. São tragédias e mais tragédias, corrupção, crises, imoralidade. Há quase dois meses quando foram divulgados alguns vídeos de sírios contando o que estava se passando na Síria, um dos vídeos mais impactantes foi o de Aya, uma menina síria de no máximo 6 anos, ensanguentada dentro de um hospital. O choque estava estampado em seu rosto, ela sequer conseguia chorar. Diante de tanto horror, a pergunta levantada foi: Por que Deus está deixando isso tudo acontecer? Ele não é soberano? Ele não é bom? Por que não impede isso?

Mas a pergunta que faço é: Se nós sendo pecadores odiamos o mal, imagine Deus! Se nós sendo pecadores nos ofendemos com o mal e com a injustiça, quanto mais o Deus sendo inteiramente Santo e Justo?

Se nós tendo nossos corações manchados pelo mal nos comovemos diante do mal imagine o coração de Deus que é puro e santo?!

Mas então, como conciliar a bondade de Deus com a existência do mal?

É nesse momento em que nós humildemente reconhecemos nossa pequenez diante do Criador dos céus e da terra. Há muitas coisas que permanecem ocultas aos nossos olhos e outras tantas que estão além da nossa finita compreensão. Mas uma coisa é certa. Deus é tão sublime que o mal não somente é incapaz de frustrar os seus decretos, como tem cooperado para o cumprimento dos Seus propósitos. Como isso ocorre é um daqueles mistérios que, como diz Deuteronômio 29:29, pertencem ao Senhor e não a nós.

Ao invés de nos preocuparmos em descobrir ou entender aquilo que Deus não nos revelou, devemos nos apegar firmemente ao que Ele revelou.

Nós cristãos cremos que Deus “está no controle da história e que Cristo conquistou a vitória sobre os poderes do mal. Isso significa que o resultado final das coisas com certeza será bom e não mau, que o propósito redentor de Deus será finalmente realizado, e que “apesar de o errado, tantas vezes, parecer tão forte, Deus é o soberano”. (Hoekema)

Essa é a nossa certeza e a Bíblia nos dá evidências disso. Se observarmos a história de José veremos como o mal intentado por seus irmãos contribuiu de forma misteriosa para o cumprimento do propósito de Deus para com o seu povo. Veja as palavras de José a seus irmãos: “Vós, na verdade intentastes o mal contra mim; porém Deus o tornou em bem, para fazer como vedes agora, que se conserve muita gente em vida” (Gn 50:20). O mesmo pode ser visto na vida do próprio Jesus. Homens maus planejaram sua morte e destruição, todavia Atos 4:27-28 nos diz: “Porque verdadeiramente se ajuntaram nesta cidade contra o teu santo Servo Jesus, ao qual ungiste, Herodes e Pôncio Pilatos, com gentios e gente de Israel, para fazerem aquilo que a tua mão e o teu propósito predeterminaram”. Deus usou o ato mais cruel da história para manifestar sua maior atitude de bondade e amor para com os homens! O mal não pôde (e não pode) conter a bondade de Deus. A cruz nos mostra que o bem está acima do mal, que Deus está acima do mal. O bem triunfa sobre o mal. O pior crime da história foi esmagado pela bondade de Deus ao terceiro dia quando Cristo ressuscitou.

Como isso é possível nós não sabemos. O que sabemos é que todas as coisas (inclusive o mal) cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que foram chamados segundo o seu propósito, a saber, serem conformes à imagem do Filho.

Não existe outra forma de responder a pergunta:

“Se Deus é bom por que existe o mal?” a não ser olhando para a cruz. Na cruz encontramos a resposta à essa pergunta. Cristo venceu o mal e esmagou a cabeça da serpente. Porém essa vitória só é desfrutada por aqueles que depositam sua fé e esperança em Jesus. Isso não significa que os cristãos não sofrem os efeitos do mal, pelo contrário, Jesus afirmou que no mundo nós passaríamos por aflições, “mas tende bom ânimo, eu venci o mundo” (Jo 16:33). Para o cristão as aflições já não remetem á derrota, mas nos lembram da nossa vitória, nos lembram que um dia o mal já não existirá porque Cristo já venceu por nós.

Pelas leis da natureza, o mal só pode resultar em mal, mas nós cristãos (e, pela graça comum de Deus, não somente nós) temos tido o privilégio de passar por situações ruins que no final das contas se tornam em grande bem para nós. Se pudéssemos testemunhar isso, faltariam horas do dia para tanto.

Podemos olhar a vida de Jó e tantos outros personagens da Bíblia para compreender isso. Jó enfrentou grande tragédia em sua vida, questionou a Deus, mas no fim concluiu que obteve maior ganho do que perdas e que os planos de Deus são maiores e melhores que os nossos.

Apesar do mal, precisamos crer e saber é que Deus é bom. Ele é soberano e está no controle de todas as coisas. Nada passa despercebido aos seus olhos. Ele é justo e cobrará dos homens todas as suas ações. Sim, o mal é trágico, mas ele tem seu prazo de validade no mundo. Não durará muito, mas o castigo contra ele será eterno e Deus há de cobrar. Ainda que Deus não reaja direta ou visivelmente contra o mal neste mundo, todo o mal está sendo contabilizado por Ele (Rm 9:22-24).. Precisamos saber que, o contrário dos homens, Deus é justo e um dia todos os homens comparecerão perante o Supremo Senhor do universo e Ele há de julgar a todos (Atos 17:31):

“Porquanto estabeleceu um dia em que há de julgar o mundo com justiça, por meio de um varão que destinou e acreditou diante de todos, ressuscitando-o dentre os mortos ”

“Todavia, eles terão de prestar contas Àquele que está pronto para julgas os vivos e os mortos” 1 Pe 4:5

Se há guerras, injustiças, crimes, corrupção; os únicos culpados são homens que, ao invés de seguir os preceitos de Deus têm se rebelado contra Ele, vivendo segundo suas próprias paixões e desejos maus.

A nossa esperança deve estar na palavra de Deus que nos diz que um dia o Senhor há de consolar e enxugar as lágrimas do seu povo. Nenhum por quê ficará sem resposta, nenhuma injustiça passará impunemente e todo mal será destruído. A mal será extinguido de uma vez por todas e não haverá mais pranto nem dor.

Deus pode impedir o mal? Sim. Mas por que não o faz? Deus não vê como o homem. Enquanto nós vemos fatos pontuais a partir do nosso lugar na história, Deus vê a história como um todo, desde o seu início até o seu fim. Enquanto nós estamos em um ponto da história tentando entender o todo que está além de nossa capacidade, Deus tem todo o roteiro nas mãos. Não estivemos no passado nem estamos no futuro, logo, só vemos e entendemos o ponto no qual estamos inseridos dentro da história. Deus não vê a história na mesma perspectiva que nós. Ou melhor, nós é que não vemos a história como Deus a vê. Ele a enxerga sob a perspectiva correta: do alto. Ele é eterno e nós finitos. Ele é o autor da História, Ele sabe qual o propósito, o rumo e o fim da História.

“Por que os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem os vossos caminhos os meus caminhos, diz o Senhor, porque, assim como os céus são mais altos do que a terra, assim são os meus caminhos mais altos do que vossos caminhos, e os meus pensamentos mais altos que os vossos pensamentos”. (Is 55:8-9)

Deus poderia descer à Síria e julgar aqueles que estão praticando barbáries?

Sim, mas a pergunta que faço é: Se Deus decidisse ir até lá para julgar o mal, restaria alguém lá? Se Deus viesse hoje julgar tudo quanto tem acontecido na Síria, ou em qualquer outro lugar do mundo, quantos se salvariam? Talvez, assim como no tempo de Ló, cidades inteiras seriam destruídas diante da ira de Deus porque todos pecaram e estão destituídos da glória de Deus (Rm 3:23). Sem Cristo, todos estão condenados.

“Quem pode suportar a tua indignação e quem subsistirá diante do furor da tua ira? A tua cólera se derrama como fogo, e as rochas são por ele demolidas” (Naum 1:6)

“Os reis da terra, os grandes, os comandantes, os ricos, os poderosos e todo o escravo e todo livre se esconderam nas cavernas e nos penhascos e nos montes e disseram aos montes: Caí sobre nós e escondei-nos da face daquele que se assenta no trono e da ira do Cordeiro, porque chegou o Grande Dia da ira deles; e quem pode suster-se?” (Ap 6:15-17)

Executar justiça sobre o mundo hoje implicaria em ter que destruí-lo assim como Deus fez durante o Dilúvio, como fez com Sodoma e Gomorra e como Deus iria fazer com Nínive e como Ele fará no Dia do Juízo final. Deus é tão misericordioso que tem sido paciente e fiel à Sua palavra à fim de que todos quanto Ele tem chamado sejam salvos. Caso contrário, ninguém se salvaria e todos estariam condenados.

Mesmo em meio a essas grandes tragédias, ouvimos testemunhos de pessoas que estão sendo salvas na Síria, no Oriente Médio de forma geral, na Ásia, na África, em todos os cantos da terra. Em meio às guerras, à fome e às perseguições, pessoas têm ouvido e conhecido à mensagem da verdadeira esperança. Isso é obra da bondade, graça e amor do nosso Deus, pois a Palavra de Deus afirma que até mesmo a ira do homem louvará a Deus (Sl 76:10). Tudo está debaixo do controle de Deus.

O que posso dizer é que Deus tem os seus meios de agir que, muitas vezes, são misteriosos aos nossos olhos. Mas nunca, em hipótese alguma devemos duvidar que Ele é bom, que Ele é soberano, que Ele é justo, que Ele é fiel.

Momentos como esse que vem ocorrendo na Síria, e em tantos outros países, devem nos levar a orar para que Deus use todo o mal para a Sua glória. Que famílias inteiras ouçam falar de Cristo e creiam nEle. Que até a ira dos homens em suas guerras resulte em glória para Deus.

Lembrem-se que Deus não está em uma queda de braço com o Diabo, como vemos em muitas ilustrações por aí. Satanás já foi vencido!

“Satanás não é um ser autônomo, como liberdade para agir e fazer o que lhe interessa […] ele é identificado como uma das criaturas de Deus e, como tal, ele não tem poder próprio e não age independentemente do Criador; pelo contrário, ele precisa pedir permissão ao Senhor para fazer qualquer coisa que deseje. Lembre-se que ele pediu a Jesus para destruir a vida do apóstolo Pedro [e o Senhor não permitiu] (Lc 22:31,32) – Pr. David Marcos

Também precisamos ter em mente que a história está se movendo em direção a um alvo, a saber, o fim do mundo como o conhecemos e o início de um novo céu e uma nova terra. Toda história, inclusive o mal, está cooperando para esse alvo, quer enxerguemos isso ou não. Os males nos lembram que aqui não é o nosso lugar.

“O fato de Deus ser o Senhor da história, implica que tudo o que ocorre serve a seu propósito, seja de uma forma ou de outra […] Nem sempre podemos ser capazes de discernir o propósito de Deus na história, mas que esse propósito existe é um aspecto primordial de nossa fé” (Hoekema)

Embora desejemos a paz mundial, o amor e a união entre os povos; precisamos ter em mente que isso nunca será plenamente possível deste lado da eternidade. Precisamos ter em mente que nenhum governo humano pode trazer isso, essas são promessas de um reino vindouro onde Cristo governará para sempre. Enquanto estivermos neste mundo, o mal existirá, enfrentaremos sofrimentos e perdas e isso não invalida em nada o poder de Deus e Seu amor.

“O mal e o bem continuam a existir lado a lado. O conflito entre ambos continua durante a era presente, porém, uma vez que Cristo conquistou a vitória, a solução do conflito nunca está em dúvida. O inimigo está lutando uma batalha perdida” (Hoekema).

Por que nós cristãos precisamos entender isso?

Sinceramente, penso que esse tipo de explicação só satisfaz a aqueles que creem no Senhor, porque todo o nosso entendimento parte da Bíblia. Para alguém que alguém que não crê na Bíblia nada disso faz sentido! É muito difícil explicar isso a um incrédulo. Por isso, creio que as respostas apresentadas nesse texto são pra nós cristãos e não para os outros. Nós não precisamos provar a existência de Deus nem entrar em debate com o mundo, mas precisamos estar sempre prontos responder a quem nos perguntam qual a razão da nossa esperança (1 Pe 3:15). Mais do que saber no que cremos é preciso saber o porque cremos.

Então, quando se perguntar ou te perguntarem Se Deus é bom por que existe o mal? Não se deixe abalar. Lembre-se que Deus é bom, apesar do mal.

“Assim como tu não sabes qual o caminho do vento, nem como se formam os ossos no ventre da mulher grávida, assim também não saber as obras de Deus, que faz todas as coisas” (Ec 11:5)

“De onde procedem guerras e contendas que há entre vós? De onde, senão dos prazeres que militam na vossa carne? Cobiçais e nada tendes; matais, e invejais, e nada podeis obter; viveis a lutar e a fazer guerras”. (Tiago 4:1)

“O Senhor é Deus zeloso e vingador, o Senhor é vingador e cheio de ira; o Senhor toma vingança contra os seus adversários e reserva indignação para os seus inimigos. O Senhor é tardio em irar-se, mas grande em poder e jamais inocenta o culpado; o Senhor tem o seu caminho na tormenta e na tempestade, e as nuvens são o pó dos teus pés” (Naum 1:2-3)

“Quem é tu, ó homem, para discutires com Deus?! Porventura, pode o objeto perguntar a quem o fez: Por que me fizeste assim? Ou não tem o oleiro direito sobre a massa […]?” (Romanos 9:19-21)

“Quem é este que escurece os meus desígnios com palavras sem conhecimento? […] Onde estavas tu, quando eu lançava os fundamentos da terra? […] Acaso anularás tu, de fato, o meu juízo? Ou me ordenarás para te justificares? […] Quem é, pois, aquele que pode erguer-se diante de mim? Quem primeiro me deu a mim, para que eu haja de retribuir-lhe? ” (Jó 38 – 41)

“Bem sei que tudo podes, e nenhum dos teus planos pode ser frustrado. Quem é aquele, como disseste, que sem conhecimento encobre o conselho? Na verdade, falei do que não entendia; coisas maravilhosas demais para mim, coisas que eu não conhecia” (Jó 42:1-3)

Encerro com este que é pra mim um dos versículos mais sublimes de toda a Bíblia. Se eu pudesse resumir tudo o que quis dizer em uma frase, seria nestes versículos:

“Oh profundidade da riqueza, tanto da sabedoria como do conhecimento de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos, e quão inescrutáveis os seus

caminhos! Quem, pois, conheceu a mente do Senhor? Ou quem foi o seu conselheiro? Ou quem primeiro lhe deu para que lhe venha a ser restituído? [Portanto, lembremo-nos pois que] porque dEle, e por meio dEle, e para Ele são todas as coisas. A ele, pois, a glória eternamente. Amém.” (Romanos 11:33-36)

Meu desejo e oração é que, apesar de mim, estas palavras tragam clareza ao coração de vocês e que Cristo seja glorificado acima de tudo.

No Amor de Cristo

Prisca Lessa

[1] O termo usado na Teologia é Teodicéia.

[1] Você pode encontra a abordagem de Agostinho nos livros “O livre-arbítrio” e “Confissões”.

Uma boa sugestão de livro: Onde está Deus quando as coisas vão mal? – está disponível em audiobook no site da Editora Fiel.