O “Impeachment” de Abimeleque

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A história nos conta que após a morte de Gideão os israelitas se voltaram novamente à idolatria abandonando os preceitos do Senhor, seu Deus. Eles não só se rebelaram contra Deus, mas também se opuseram aos filhos de Gideão e não usaram de benevolência para com eles. Juízes 8:30,31 conta que Gideão teve 71 filhos (com suas muitas mulheres) e entre eles havia um, cujo nome era Abimeleque, e este era tido como ilegítimo, por se tratar do filho de uma concubida da cidade de Siquém.  O capítulo 9 de narra a história de Abimeleque.

É importante ressaltar que naquele tempo ainda não havia rei em Israel, pois o Senhor era quem governava sobre seu povo e os líderes das tribos, juízes, profetas e sacerdotes eram representantes de Deus perante o povo.  Porém, Abimeleque muito astuto, se colocou como candidato a eleição e foi até Siquém, cidade de sua mãe, para fazer propaganda eleitoral (9:1), a fim de convencer os habitantes da cidade a lhe elegerem como rei. Sua estratégia foi perspicaz. Seu principal argumento era que melhor seria para o povo ser governado por apenas um dos filhos de Gideão, no caso ele, do que pelos setenta (v.2), além disso, sendo filho de uma mulher de Siquém ele, como todo bom político, argumentou que era gente do povo, “gente como a gente”: “Lembrai-vos também de que sou osso vosso e carne vossa” (v.2), em outras palavras, quem melhor do que ele, descendente daquele povo para governar?!

Lendo esse texto é difícil não recordar a campanha presidencial do ex- presidente Lula em 2002. Uma das razões pelas quais ele teve sucesso na eleição foi seu forte apelo popular. Ele se apresentou como alguém do povo, sem estudo, trabalhador e etc e isso foi cativante (na época). Além disso, na mentalidade de Abimeleque e do povo de Siquém, o simples fato dos filhos legítimos de Gideão não serem parte daquela gente os desqualificava como governadores sobre eles – nada diferente da mentalidade de hoje em que um candidato não é qualificado por sua capacidade de governo, mas pela identificação popular, ou seja, preferencialmente, pobre, mulher, não cristão e etc. Se for alguém que nasceu numa família de classe média, por exemplo, ele já perde uma boa parcela de chances. Mas fato é que um bom governador tem que saber governar, isso basta, coisa que Abimeleque não sabia fazer, mas sua estratégia deu certo e ele foi eleito democraticamente como rei “junto ao carvalho memorial que está perto de Siquém” (v.6).

Abimeleque tinha um caráter usurpador, mesquinho e interesseiro e logo que ganhou a confiança do povo (v.3,4), montou sua equipe (de governo) que era constituída de “homens levianos e atrevidos” ou em outras palavras, ociosos e vadios: gente que não quer trabalhar. Disso Brasília está cheia e aqui vale uma lição, se você conhecer o caráter de um governador veja quem são seus aliados.

Na primeira oportunidade que Abimeleque teve, ele foi até a terra onde habitavam seus irmãos e os matou para ver-se livre de qualquer competição. Apenas um deles conseguiu escapar, seu irmão caçula, Jotão (v.5).

Abimeleque reinou durante três anos, até que algo aconteceu: “suscitou Deus um espírito de aversão entre Abimeleque e os cidadãos de Siquém e estes se agiram traiçoeiramente contra Abimeleque” (v. 23). Veja que interessante, os mesmos que elegeram a Abimeleque como rei, após alguns anos de governo, se tornaram contrários a ele e decidiram derrubá-lo do poder [qualquer semelhança com o atual cenário político nacional é mera coincidência].  Mas por trás dessa atitude voluntária de oposição havia a mão de Deus. O texto diz que foi Deus quem suscitou um espírito de aversão contra Abimeleque e a causa disso vem logo a seguir: “para que a vingança da violência praticada contra os setenta filhos de Jerubaal viesse, e o seu sangue caísse sobre Abimeleque, seu irmão, que os matara, e sobre os cidadãos de Siquém, que contribuíram para que ele matasse os próprios irmãos” (v.24). Por meio dessa contenda, Deus iria julgar crimes cometidos outrora, pois, Ele nunca deixa de punir o mal, podem passar dez, vinte ou cem anos, uma hora a bomba estoura e ai daquele que estiver com ela nas mãos. Há quemMuitos afirme que a Dilma está pagando por erros que não foram cometidos em seu governo, ainda que isso seja verdade e ela seja apenas a ponta do iceberg, é fato que “espírito de aversão” que se manifestou a partir de 2013, com o lema “O gigante acordou” com movimentos de rua, foi suscitado durante o seu governo. Por que a bomba que foi acionada lá atrás veio estourar nas mãos e no governo Dilma? Isto eu não sei, mas estou ciente de que a corrupção existiu em outros governos – e continuará a existir se não for combatida agora – mas em todas as coisas dou graças a Deus porque dentro do mistério de sua Providência, Ele está julgando o mal e os atos outrora cometidos.

Algo interessante no verso 24 diz respeito ao fato de que aqueles que deram início ao impeachment de Abimeleque, não iriam sair ilesos, pois, o juízo também era sobre eles. Eles não deviam pensar que não seriam julgados. Veja que quem deu início ao processo de impeachment, tanto de Abimeleque, quanto de Dilma, foram aqueles que eram seus aliados e que por alguma insatisfação interna acabaram promovendo um movimento de oposição. Assim como o povo de Siquém não deixou de ser julgado, curiosamente Cunha, que esteve à frente do processo contra Dilma acabou recebendo sua “recompensa” também, e ainda há outros que também serão julgados.

Portanto, ainda que os meios humanos sejam falhos, Deus usa todas as coisas, até mesmo o ímpio para cumprir seus propósitos. Cabe a nós, enquanto cristãos, ansiar pela justiça, não unilateralmente, mas como uma balança justa (Dt 25.13-16), que a espada perfure dos dois lados, a despeito do partido, prestígio político ou religião. Seja no governo Dilma, Temer ou qualquer outro. Precisamos estar cientes de que nós não estamos lutando contra uma pessoa, mas contra um sistema que tem sugado toda a riqueza do país e que, portanto, deve ser combatido, doa a quem doer.

Pessoalmente, creio que afastamento da presidente pode ser o primeiro de muitos atos seguintes contra a corrupção nacional, ainda que muitos não pensem assim, eu prefiro ter esperança e acreditar que Deus ainda preserva homens honestos para guiar a nação.

Aqueles que se levantaram para derrubar Abimeleque não eram inocentes, também tinham sua parte no bolo e seu pedaço na pizza. E Deus os julgou e eu oro para que Ele continue julgando Abimeleques e siquemitas, oro para que haja justiça. Sei que a justiça dos homens nunca será perfeita, sei que nenhum homem é herói, nem os juízes que Deus levantou em Israel e nem os que Deus tem levantado hoje, mas que eles cumpram o seu papel e que a vontade de Deus seja feita por meio deles.  Como disse um teólogo chamado Anthony Hoekema, eu creio que “toda a História deve ser vista como um desenvolvimento do propósito eterno de Deus”, embora isso nem sempre seja claro para nós, devemos estar convictos de que Deus está conduzindo a história para um fim divinamente direcionado.

Abimeleque relutou para sair do poder. Foi um longo processo até que ele fosse destituído e, no fim das contas ele morreu da forma mais improvável, uma mulher lhe jogou uma pedra de moinho na cabeça e seu crânio se partiu (9:50-57) e a vergonha da humilhação fez com que ele implorasse a seu moço que lhe ferisse com a espada. Depois dele Deus levantou Tola por juiz de Israel e houve paz por vinte três anos.

Que Deus nos livre da corrupção e conceda essa paz.

No amor de Cristo

Prisca Lessa