DIAS DE LUTA, DIAS DE GLÓRIA

3“Exultai e levantai as vossas cabeças, porque a vossa redenção se aproxima” (Lucas 21:28)

Dizem que a arte tem o poder de nos arrebatar da realidade ou conectar-se a ela de maneira profunda. Isso passou a fazer muito sentido pra mim, especialmente, nesta semana após ter assistido a trilogia de O Senhor dos Anéis. As memórias da trama ficaram tão vívidas em minha mente que hoje enquanto lia o texto de Lucas 21:20 – 28 não pude deixar de traçar alguns paralelos entre as palavras de Jesus e o pensamento de Tolkien. Nas próximas linhas gostaria de compartilhar com vocês algumas dessas meditações.

“Haverá grande aflição na terra e ira contra este podo. Cairão ela espada e serão levados como prisioneiros para todas as nações. Jerusalém será pisada pelos gentios, até que os tempos deles se cumpram.\Haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas. Na terra, as nações estarão em angústia e perplexidade com o bramido e a agitação do mar. Os homens desmaiarão de terror, apreensivos com o que estará sobrevindo ao mundo; e os poderes celestes serão abalados.” (Lc 21:23 – 26)

Ao longo da passagem de Lucas 21 Jesus comunicou aos seus discípulos acerca dos acontecimentos que precederiam a sua vinda: guerras, fome, grande aflição, perseguição, terror e destruição, um cenário tenebroso e desolador. Contudo, se olharmos adiante, nos versos 27 e 28, veremos que tais fatos não foram relatados para trazer desolação, e, sim, consolação. Como, todavia, poderia um cenário de sofrimento e destruição promover algum tipo de consolo e alegria? Parece descabido, mas Jesus disse aos discípulos que “exultassem e levantassem as suas cabeças” quando essas coisas começassem a acontecer, a causa vem logo a seguir, “porque a redenção estava próxima” (cf. Lc 21:28).

“Então, se verá o Filho do homem vindo numa nuvem com poder e grande glória” (Lc 21:27)

Em outras palavras, o sofrimento anunciado era, na realidade, o prenúncio de uma alegria vindoura capaz de eclipsar toda e qualquer tristeza. Essa grande alegria capaz de eclipsar a todos os sofrimentos é aquilo que Tolkien chamou de eucatástrofe: a “alegria além das muralhas do mundo”. A eucatástrofe (eu– é um prefixo grego que significa “bom”, podendo ser traduzida como “boa catástrofe”), é comumente encontrada na ficção, refere-se ao momento em que ocorre a grande reviravolta da trama, uma virada de jogo que redunda em um “final feliz”.

Porém, há algo importante a saber a respeito da eucatástrofe: ela nunca ocorre sozinha, ela é sempre precedida de um outro momento, que é justamente o seu oposto, a discatástrofe (“dis” prefixo grego que significa “mau”, podendo ser traduzida como “má catástrofe” ou desgraça), Tolkien criou esse termo ficcional para se referir ao ato que antecede a eucatástrofe. A discatástrofe é o momento em que tudo parece perdido e o mal prevalece. É justamente no ápice da desolação que a tragédia dá lugar a alegria, sendo substituída de forma triunfante pela beleza do final feliz, a repentina e miraculosa graça”, como chamou Tolkien.

Através do pensamento de Tolkien podemos compreender que sem a indesejável discatástrofe não haveria eucatástrofe. Não haveria a “grande virada” se antes não houvesse a tragédia. Do mesmo modo, voltando nossos olhos para Lucas 21, podemos compreender que Jesus estava ensinando aos discípulos que para que viesse o consolo era necessário que, antes, viesse a desolação. Essa foi a mensagem ao longo de todo o Seu ministério: “é necessário que a semente morra para que, então, haja vida”(Jo 12:24). Eis a dinâmica que Deus estabeleceu para a nossa breve e passageira jornada neste mundo: os dias de luta precedem os dias de glória.

“Em verdade, em verdade Eu vos afirmo que chorarão e se lamentarão, enquanto o mundo se alegrará. Vós vos entristecereis, porém, a vossa tristeza se transformará em grande alegria. A mulher que está dando à luz sofre dores e tem medo, porque chegou a sua hora; mas, quando o bebê nasce, ela já não mais se lembra da angústia, por causa da alegria de ter vindo ao mundo seu filho. Também vós agora estais tristes e apreensivos; este é um momento de sofrimento [a indesejável discatástrofe], mas Eu vos verei de novo, e então muito vos alegrareis; e mais, ninguém tirará a vossa alegria [eucatástrofe, o desejado final feliz].” (João 16:20 – 22)

Deus em Sua soberania nos permite experimentar em nossa jornada doses de discatástrofes e eucatástrofes. Passamos pelas íngremes montanhas do sofrimento e pelos vales da desolação, mas, é verdade também que, depois de algum tempo, quando olhamos para trás percebemos que os sofrimentos enfrentados nos trouxeram algum tipo de bênção maior. Nem sempre conseguimos mensurar ou explicar como isso ocorre, mas, de fato, vivenciamos essa misteriosa dinâmica Divina em nossas vidas, experimentando resquícios de algo muito maior e melhor. Como disse C.S. Lewis: “Existem coisas melhores adiante do que qualquer outra que deixamos para trás.” Esta é, certamente, uma verdade de Deus.

Mas, por vezes deixamos que as circunstâncias e adversidades ocultem essa verdade de nós, esquecemo-nos que por mais difíceis que sejam os momentos pelos quais passamos, há um Deus de amor olhando para nós; Ele não somente deseja o nosso bem como trabalha para que isso ocorra. Ele é tão amoroso e bom que não permite que o sofrimento ultrapasse sua medida, tornando-o suportável até que possamos desfrutar uma repentina e miraculosa graça.

Devemos passar pelo sofrimento com esperança, tendo em vista a alegria vindoura.

É fato que quando passamos pelo dia da aflição parece não haver qualquer sombra de esperança, mas, pela fé devemos crer que por meio das discatástrofes da vida Deus está forjando em nós um tesouro de valor eterno. Uma alegria que irá transpor as muralhas deste mundo. Os dias difíceis virão, o Senhor nos alertou; mas, que nossos corações não desanimem, que a nossa fé não esmoreça, pois, é necessário que venham os dias difíceis até que Ele venha. É necessário passar pela dor para que experimentemos o alívio, é necessário passar pela tristeza para que experimentemos a verdadeira alegria. Os sofrimentos enfrentados nessa vida sempre serão como pó comparados a alegria que o Senhor tem reservado para nós na eternidade. Há uma canção que diz que não há sofrimento na terra que o Céu não possa curar, podemos lançar nossos sofrimentos sobre Cristo, bater à porta da misericórdia, pois o Senhor nos acolherá.

“(…) a nossa leve e momentânea tribulação produz para nós cada vez mais abundantemente um eterno peso de glória” (2 Co 4:17).

Deus está conosco, mesmo quando passamos por dias escuros e noites sombrias, mesmo quando nos sentimos solitários e abandonados, e mesmo quando o mal parece prevalecer. Os dias de luta darão lugar a dias de glória, sua promessa é infalível. Coragem.

“Exultai e levantai as vossas cabeças,

porque a vossa redenção se aproxima” (Lucas 21:28)

“Assim como o sol

Tu tens sido a nossa luz

Levando-nos a lugares bonitos

Assim como a luz das estrelas

Tu brilhas na noite escura

Levando-nos a lugares bonitos

Assim como a atmosfera

Tu vens para nos cercar aqui

Levando-nos para lugares bonitos

Nós caminhamos através do fogo,

Mas, Tu nos fizestes mais brilhantes”

(Constant, Charlie Hall)

No Amor de Cristo,

Prisca Lessa